domingo, 26 de dezembro de 2010

domingo, 12 de dezembro de 2010


Contra a transparente escuridão.

Voltou-se para Mercedes e , como se pusesse a examiná-la, uma estranha intranqüilidade fluía em seu sangue. Às vezes acometia-o uma febre que o levava a errar sozinho, à noite, ao longo da avenida silenciosa. A paz dos jardins e as benevolentes luzes nas janelas derramavam terna influência dentro do seu coração sem sossego. A algazarra das crianças nos folguedos irritavam-no e suas vozes bobas faziam-no sentir ainda mais agudamente do que sentira em Clogwes quanto era diferente dos outros. Não queria brincar. O que queria era encontrar no mundo real a imagem sem substância que a sua alma tão constantemente baralhava. Não sabia onde a descobriria, nem como; mas um pressentimento o advertia sempre que essa imagem, sem nenhum ato aparente seu, lhe viria ao encontro. Haviam de se encontrar sem alvoroço, uma entrevista talvez num daqueles portões ou noutro lugar mais secreto. Estariam sós, cercados pela treva e pelo silêncio; e nesse momento de suprema ternura ele seria transfigurado. Dissolver-se-ia dentro de qualquer coisa impalpável, sob os olhos dela. E depois então, num momento se transfiguraria. Prostração, timidez e inexperiência abandoná-lo-iam nesse mágico momento.

*James Joyce em Retrato do artista quando jovem.
Eileen possuía mãos delgadas, frias, e brancas, também, mas era uma menina. Mãos que pareciam marfim; só que tenras. Esse era o sentido da Torre de marfim; mas os protestantes incapazes de entender faziam gracejos com isso. Uma vez ele parara junto dela, vendo-a olhar para os pavimentos do hotel. Um servente estava enrolando uma bandeira numa haste e um cão fox-terrier corria em todas as direções na relva batida de sol. Ela havia posto a sua mão no bolso dele onde ele estava com a sua já enfiada; e ele havia sentido quão fria , delgada e macia era a mão dela. Ela dissera que bolsos eram coisa engraçada de ter; e então, depois, sem mais aquela, tinha parado de falar e saíra a correr, rindo, pelo declive abaixo do caminho. Seu lindo cabelo se tinha derramado atrás dela como ouro ao sol. Torre de marfim. Casa dourada. É pensando direito nas coisas que a gente as entende.

*James Joyce em Retrato do artista quando jovem.

domingo, 5 de dezembro de 2010


_Há um toque de primavera no ar, é verdade.
_Não sou eu nesse retrato, não sou eu que fumo esse cigarro, não sou aquela que a pouco lavava a louça do almoço.
_Traga as xícaras e as faturas. Tome nota de tudo, é hora de nos sentarmos com o contador.
_ Não vivo a cidade, não anseio por uma vida de família. É o que se espera de alguém que nunca esteve sozinho.
_ Troque a camisola, é dia.
_ Farewell my love.

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010


Des mon coeur séparé la part mystérieuse






Para L.

The fascination of what's difficult ( William Butler Yeats- 1910)

The fascination of what´s difficult
Has dried the sap out od my veins, and rent
Spontaneous joy and natural content
Out of my heart. There´s something ails our colt
That must, as if it had not holy blood,
Nor on Olynpus leaped from cloud to cloud,
Shiver under the lash, stain, sweat and jolt
As though it dragged road metal. My curse on plays
That have to be set up in fifty ways,
On the day's war with every knave and dolt,
Theatre business, management os men.
I swear before the dawm comes round again
I´ll find the stable and pull out the bolt.

O prazer do difícil ( Tradução de Augusto de Campos)

O prazer do difícil tem secado
A seiva em minhas veias. A alegria
Espontânea se foi. O fogo esfria
No coração. Algo mantém cercado
Meu potro, como se o divino passo
Já não lembrasse o Olimpo, a asa, o espaço,
Sob o chicote, trêmulo, prostrado,
E carregasse pedras. Diabos levem
As peças de sucesso que se escrevem
Com cinqüenta montagens e cenários,
O mundo de patifes e de otários
E a guerra cotidiana com seu gado,
A fazer de teatro, afã de gente.
Juro que antes que a aurora se apresente
Eu descubro a cancela e abro o cadeado.

* W.B. Yeats por Augusto de campos em Linguaviagem. Crítica via Tradução. Crítica de iluminação contra a crítica da maledicência. Exopoesia para combater a egopoesia.