terça-feira, 19 de abril de 2011

Podemos agora começar a ver a diferença entre a nudez e o nu. Em seu livro The Nude Keneth Clark sustenta que a nudez é simplesmente estar sem roupa, enquanto que o nu é uma forma de arte. Segundo ele, um nu não é o ponto de partida de uma pintura, mas a forma de ver, que a pintura consegue efetuar. Até certo ponto, isso é verdade- embora a forma de ver um nu" não se confine necessariamente à arte: há também fotografias de nus, poses de nus, gestos de nus. O que é verdade é que o nu sempre é convencionado- e a autoridade para as convenções do nu deriva de uma certa tradição da arte.
O que significam essas convenções? O que um nu significa? Não é suficiente responder a essas questões meramente em termos de forma artística, pois é bastante claro que o nu também se relaciona com a sexualidade vivida.
Estar despido é sermos nós mesmos.
Estar nu é ser visto despido por outros e contudo não ser reconhecido como quem se é. Um corpo despido tem de ser olhado como um objeto a fim de tornar-se um nu. (Vê-lo como um objeto estimula seu uso como um objeto.) A nudez revela a si mesma. O nu é colocado em exibição.
Estar despido é estar sem disfarce.
Estar em exibição é ter a superfície da própria pele, os cabelos do próprio corpo, transformados num disfarce que, naquela situação, jamais pode ser abandonado. O nu é uma forma de vestuário.
Na maioria das pinturas a óleo européias do nu, o protagonista principal nunca é pintado. Ele é o espectador diante do quadro e presume-se que seja um homem. Tudo é a ele dirigido. Tudo deve parecer como sendo o resultado dele estar ali. É para ele que as figuras assumiram a sua nudez. Porém ele é, por definição, um estranho- vestindo ainda as suas roupas.

*John Berger em Modos de ver.

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