sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

_Eu sou stephen Dedalus. Estou caminhando ao lado do meu pai cujo nome é Simão Dedalus. Estamos em Cork, na Irlanda. Cork é uma cidade. O nosso quarto é no Hotel Vitória. Vitória, Stephen e Simão. Simão Stephen e Vitória. Nomes.
A lembrança da sua infância subitamente se nublou. Tentou evocar alguns dos seus momentos vividos, mas não pôde. Apenas recordava nomes. Dante, Parnell, Clane, Clogowes. Um garotinho tinha aprendido geografia ensinada por uma senhora de idade que conservava duas escovas no seu guarda-vestidos. Depois fora mandado de casa para o colégio, tinha feito a sua primeira comunhão, tinha comido fatias de ameixadas que guardava no gorro do críquete, observara a luz do fogo saltar e dançar na parede dum quartinho na enfermaria e sonhara ter morrido, haver o reitor rezado missa em sua intenção com uma casula negra e dourada, ter sido enterrado no cemitériozinho da comunidade, lá na grande alameda de limoeiros. Mas não morrera naquela ocasião, não. Parnell, esse sim, tinha morrido. Não tinha havido missa na capela pelo morto e nem procissão. Ele não tinha morrido, se esvaíra como uma névoa ao sol. Tinha se perdido, ou errara fora da existência, pois já não existia mais. Que estranho que era pensar nele saindo da existência desse modo, não pela morte, mas se desvanecendo ao sol, ou se perdendo e ficando esquecido nalgum lugar do universo! Seria estranho ver o seu pequeno corpo reaparecer por um momento que fosse: um garotinho com um terno pardo com um cinturão; estaria com as mãos nos bolsos dos lados e as suas calças estariam apertadas, à altura dos joelhos, por elásticos.

* James Joyce em Retrato do artista quando jovem.

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