Como se me tivesse ouvido, ergueu os olhos, ajeitou-se de leve no assento e suspirou. Parecia desculpar-se e ao mesmo tempo dizer-me: "Se ao menos você soubesse!" E depois voltou a olhar a vida. "Mas eu sei", respondi em silêncio, dando uma olhadela no Times, só por hábito. "Sei de todos os assuntos: 'A paz entre a Alemanha e as Forças Aliadas foi anunciada ontem em Paris - Signor Nitti, o primeiro-ministro italiano - Um trem de passageiros chocou-se com um trem de carga em Doncaster...' Todos nós sabemos - o Times sabe - mas fingimos que não". Mais uma vez meus olhos se deslocaram para além das margens do jornal. Ela estremeceu, contorceu o braço de modo estranho até o meio das costas e balançou a cabeça. De novo mergulhei no meu grande reservatório de vida. "Escolha o que lhe agrada", continuei, " está tudo no Times!" De novo, com infinito fastio, ela moveu a cabeça de um lado para o outro, até que esta, como um pião exausto de girar, assentou-se no pescoço.
O Times não podia protegê-la contra uma dor como a dela. Mas outros seres humanos negaram-se à comunicação. O melhor a fazer contra a vida era dobrar o jornal de modo a torná-lo um quadrado perfeito, encrespado, compacto, impermeável até mesmo à vida. Feito isso, levantei rapidamente os olhos, armada do escudo feito por mim mesma. Ela trespassou-me o escudo; fitou-me dentro dos olhos como que a procurar, na profundidade deles, um sedimento qualquer de coragem para depois dissolvê-lo em barro. Sua convulsão por si só negava toda esperança, abatia toda ilusão.
Virginia Woolf em Um romance não escrito.
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